Xixilado!

em sábado, setembro 19, 2009
De repente, percebi que tenho afeição por algumas palavras antiquadas. Por exemplo, sou da turma que usa e defende o pronome relativo cujo, cujo emprego dá ao texto uma cara assim, sei lá, de velho. Jovem que é jovem não fala cujo. O dito cujo vai preferir outro termo, e minha vingança aqui é chamar esse suposto jovem de cujo. Pensando bem, acho que esse meu gosto pelo vernáculo antigo tem alguma influência da minha avó paterna, com quem pude conviver na infância, até sua morte, em 1978.

Eu achava o máximo ela ter nascido em 1890. Vinha do então século passado, o Século 19 – por ironia, hoje eu é que sou do século passado, o 20. Pois bem, eu me divertia perguntando sobre coisas de dantes. Aí, descobri que a mulata Sinhá Madalena, toda encarquilhada, era ainda mais velha que minha avó, coisa de uns cinco anos. Então nascera antes de 1888, tempo da escravidão ainda! O projeto de jornalista aqui, em fase escolar, atacava: Sinhá Madalena, como era a escravidão? Ela contava que tinha nascido “fôrra”. E eu: ah, então era por causa da Lei do Ventre Livre! E Sinhá Madalena me olhava sem entender direito que lei era essa e retomava a prosa com minha avó. Devia pensar: que menino saliente!

Saliente era um desses termos que me faziam rir demais. Não tanto quanto xixilado, que significava o extremo da “saliência”. Na fase saliente, a criança está atrevida, passada das contas. Na fase xixilada, já é descaramento total, falta de respeito aos mais velhos. Era quando minha avó dava a sentença: tome estilo, menino! Nunca fui alvo dessa reprimenda, era bem-comportado, tinha “estilo”. Já meu irmão... um xixilado, sem estilo.

Havia outros termos e expressões associados a xixilamento – ou o certo seria xixilagem? Tudo demarcava o respeito incondicional que os jovens devem dedicar aos mais velhos. Se a criança se xixilasse, cabia ao velho perguntar: está tomando sopa comigo? Ou então: está pensando que sou seu pariceiro?

Pariceiro, xixilado, saliente: termos cujo uso o tempo eliminou. Azar! Sigo gostando da graça antiga deles. Coisas de avó. E nem penso em abrir mão do uso do cujo.




Postado por Erica Ferro

2 comentários:

Arelly disse...

eu uso pariceiro, e saliente às vezes.
mas xixilado eu nunca nem ouvi falar!

É uma onda algumas coisas que a minha vó diz, resenha demais.

Hoje ter estilo é outra coisa, mais infeliz que felizmente.

Ana Seerig disse...

Bah, eu nunca tinha reparado que 'cujo' tava fora de moda... Sempre gostei do dito 'cujo' ahuhsauah

Também adorei essa crônica do Nivaldo... Aliás, qual delas eu não gosto??

 
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