“A vida ingrata de quem acha que é notícia, de quem acha que é momento, na tua tela querem ensinar a fazer comida uma nação que não tem ovo na panela, que não tem gesto, quem tem medo assimila toda forma de expressão como protesto.” (Fernando Anitelli)
Ao sair da escola, seu humor não havia melhorado. Sabia que tinha alguma chance de passar de ano. E, sinceramente, depositara toda sua esperança naquela “alguma chance”.
Tá, foi um ano em que não se aplicou e não estava nem aí para entrar (ou não) na escola. “Amizade acima de tudo”, era seu lema. Mas não gostava agora da idéia de ver alguns de seus amigos no terceiro ano e ele, continuaria no segundo.
Continuou pensando em como dar a notícia aos seus pais enquanto caminhava até em casa. Em quando dar a notícia.
Olhava em volta, como se procurasse algum sinal sobrenatural dizendo que era um sonho. Mas peraí, também não era o fim do mundo, e não era nenhum pesadelo. Já esperava por isso, pensou. E foi só mais um ano, afinal... Mais um ano na vida de merda que levava.
Chegou em casa depois de andar algum tempo sem rumo, e viu que estava sozinho. Sozinho e decepcionado. A última coisa que estava era triste. Resolveu ir dormir, ouvindo Iron Maiden no último volume. A casa estremecia.
Acordou horas depois, amarrotado, com a cara amassada e os olhos inchados. Queria ter acordado um ano depois para dar aos seus pais a notícia que passara de ano. Mas não dormiu um ano, e sabia que teria que levantar e encará-los, enquanto eles encarariam a TV.
O que havia de mau em não ter passado de ano? Aprenderia ( e muito mais ). Era melhor pensar assim.
Ué?! Eles não aprendiam e reviam mil e uma coisas na TV sempre as mesmas mil e uma coisas escolhidas sabe-se lá por quem, e o pior ainda, por quê. Deixavam-se levar pelo jornal das oito, a vida ridícula, fictícia, “que sempre se dá um jeito” e quem tem sempre um final feliz da novela das nove, e eram manipulados por aqueles que se acham no direito de passar ao seu “querido telespectador” apenas aquilo que julgavam importante.
Talvez ele se sentisse assim também em relação à escola, as mil e uma coisas que enfiavam goela abaixo dos alunos, sem nem saber a opinião deles sobre nada. Sempre foi assim, vocês precisam saber disso, era o discurso pronto dos professores quando qualquer um dos alunos questionava. O fato é que tudo aquilo que aprenderia na escola seria importante para ganhar um diploma de conclusão do segundo grau e só. Faria diferença alguma na sua vida? Gostava mais de uma matéria que de outra, e não passara para o terceiro ano exatamente por causa das matérias que não gostava.
E a TV deles?! Eles gostavam mais de um determinado jornal que do outro, e por quê?! Gostavam mais da reportagem que um editor escolhia para a reportagem principal que o outro escolhia?! Na TV não há reportagem livre, ninguém passa apenas o fato, sem interpretação. Nenhuma novela seria capaz de simular a vida real (Big Brother não é a vida real!). Achava engraçado quando um dia estourava em todas as emissoras e noticiários urgentes o roubo e a prisão de um certo canalha (digo, político)e no dia seguinte não se falava mais nele. Abafada, comprada, calada, completamente controlada. É isso que a TV e todo seu conteúdo (se é que se pode chamar assim) lhe dava a impressão.
Desnecessária, precária, sem escolha e sem consideração, é isso que a escola significava para ele.
Chega de discutir consigo mesmo. Era hora de sair do quarto, lavar o rosto e ir conversar , ou discutir, ou comunicar seus pais. Enfim, de alguma maneira teria que falar.
Entrou no banheiro e não saía da sua cabeça em como falar. Olhou-se no espelho e viu o banheiro todo atrás de si. Eles deixavam-se ser manipulados. Nojentos consumistas. O banheiro fora comprado graças aos “reclames do plim plim” que os convenceu que o banheiro atual não era bom o suficiente. O curioso é que o banheiro só se tornou péssimo depois daquele comercial que mudou o banheiro que até então era ótimo.
Já ouviram a frase: “O momento que mudou a minha vida”?
Naquela casa, a frase se transformava em: “O comercial que mudou o banheiro” (e a marca do arroz, a cor da parede da sala, a marca da impressora, o piso da cozinha, a cor da junta dos azulejos da lavanderia, o refrigerante para um “mais saudável”, o perfume do pai, o corte de cabelo, e, já ia me esquecendo!, a cor do cabelo da mãe, e o senso de ridículo de ambos, entre outros).
Ficou se olhando e percebeu o quão ridícula era sua situação. Lavou novamente o rosto, respirou fundo, contou até dez, cem, mil. E foi até a sala e, para sua surpresa... Os pais estavam com a bunda atolada no sofá super confortável (afinal, aquele maravilhoso sofá estava mais barato na promoção... da TV), assistindo a sua manipuladora favorita.
E só notaram a presença do filho quando, depois de respirar fundo algumas vezes, ele coçou a garganta e disparou:
“Acho que precisamos desligar a TV”.
Tá, foi um ano em que não se aplicou e não estava nem aí para entrar (ou não) na escola. “Amizade acima de tudo”, era seu lema. Mas não gostava agora da idéia de ver alguns de seus amigos no terceiro ano e ele, continuaria no segundo.
Continuou pensando em como dar a notícia aos seus pais enquanto caminhava até em casa. Em quando dar a notícia.
Olhava em volta, como se procurasse algum sinal sobrenatural dizendo que era um sonho. Mas peraí, também não era o fim do mundo, e não era nenhum pesadelo. Já esperava por isso, pensou. E foi só mais um ano, afinal... Mais um ano na vida de merda que levava.
Chegou em casa depois de andar algum tempo sem rumo, e viu que estava sozinho. Sozinho e decepcionado. A última coisa que estava era triste. Resolveu ir dormir, ouvindo Iron Maiden no último volume. A casa estremecia.
Acordou horas depois, amarrotado, com a cara amassada e os olhos inchados. Queria ter acordado um ano depois para dar aos seus pais a notícia que passara de ano. Mas não dormiu um ano, e sabia que teria que levantar e encará-los, enquanto eles encarariam a TV.
O que havia de mau em não ter passado de ano? Aprenderia ( e muito mais ). Era melhor pensar assim.
Ué?! Eles não aprendiam e reviam mil e uma coisas na TV sempre as mesmas mil e uma coisas escolhidas sabe-se lá por quem, e o pior ainda, por quê. Deixavam-se levar pelo jornal das oito, a vida ridícula, fictícia, “que sempre se dá um jeito” e quem tem sempre um final feliz da novela das nove, e eram manipulados por aqueles que se acham no direito de passar ao seu “querido telespectador” apenas aquilo que julgavam importante.
Talvez ele se sentisse assim também em relação à escola, as mil e uma coisas que enfiavam goela abaixo dos alunos, sem nem saber a opinião deles sobre nada. Sempre foi assim, vocês precisam saber disso, era o discurso pronto dos professores quando qualquer um dos alunos questionava. O fato é que tudo aquilo que aprenderia na escola seria importante para ganhar um diploma de conclusão do segundo grau e só. Faria diferença alguma na sua vida? Gostava mais de uma matéria que de outra, e não passara para o terceiro ano exatamente por causa das matérias que não gostava.
E a TV deles?! Eles gostavam mais de um determinado jornal que do outro, e por quê?! Gostavam mais da reportagem que um editor escolhia para a reportagem principal que o outro escolhia?! Na TV não há reportagem livre, ninguém passa apenas o fato, sem interpretação. Nenhuma novela seria capaz de simular a vida real (Big Brother não é a vida real!). Achava engraçado quando um dia estourava em todas as emissoras e noticiários urgentes o roubo e a prisão de um certo canalha (digo, político)e no dia seguinte não se falava mais nele. Abafada, comprada, calada, completamente controlada. É isso que a TV e todo seu conteúdo (se é que se pode chamar assim) lhe dava a impressão.
Desnecessária, precária, sem escolha e sem consideração, é isso que a escola significava para ele.
Chega de discutir consigo mesmo. Era hora de sair do quarto, lavar o rosto e ir conversar , ou discutir, ou comunicar seus pais. Enfim, de alguma maneira teria que falar.
Entrou no banheiro e não saía da sua cabeça em como falar. Olhou-se no espelho e viu o banheiro todo atrás de si. Eles deixavam-se ser manipulados. Nojentos consumistas. O banheiro fora comprado graças aos “reclames do plim plim” que os convenceu que o banheiro atual não era bom o suficiente. O curioso é que o banheiro só se tornou péssimo depois daquele comercial que mudou o banheiro que até então era ótimo.
Já ouviram a frase: “O momento que mudou a minha vida”?
Naquela casa, a frase se transformava em: “O comercial que mudou o banheiro” (e a marca do arroz, a cor da parede da sala, a marca da impressora, o piso da cozinha, a cor da junta dos azulejos da lavanderia, o refrigerante para um “mais saudável”, o perfume do pai, o corte de cabelo, e, já ia me esquecendo!, a cor do cabelo da mãe, e o senso de ridículo de ambos, entre outros).
Ficou se olhando e percebeu o quão ridícula era sua situação. Lavou novamente o rosto, respirou fundo, contou até dez, cem, mil. E foi até a sala e, para sua surpresa... Os pais estavam com a bunda atolada no sofá super confortável (afinal, aquele maravilhoso sofá estava mais barato na promoção... da TV), assistindo a sua manipuladora favorita.
E só notaram a presença do filho quando, depois de respirar fundo algumas vezes, ele coçou a garganta e disparou:
“Acho que precisamos desligar a TV”.
Um conto de Letícia Christmann, feito para um trabalho do Senac, de um curso longíquo já, para o livro "Contos de uma Realidade Cruel".
Um comentário:
Poxa vida, conhecia uma escritora e não sabia!!
Muito legal o blog de vocês!!!
Sempre que atualizaram me avisem que eu vou ter o prazer de lê!
Lê entendeu?!
ashusasa
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