Andemos, pois. Vivamos, pois. Suguemos os nutrientes dos dias, de todos os dias...!
Hoje quero postar uma crônica do meu querido Nivaldo Pereira; já havia postado crônicas dele aqui.
Resumo básico sobre Nivaldo: Jornalista e colunista do jornal Pioneiro de Caxias do Sul. Um ser humano extremamente carismático; digo isso pela troca de e-mails com ele, pela gentileza dele de me mandar um livro autografado, pelos elogios, enfim... É uma pessoa digna de admiração e respeito: grande jornalista, cronista e, claro, grande pessoa.
A crônica a seguir foi publicada no jornal Pioneiro, na sexta-feira. Confira originalmente aqui.
Bolhas
Duas cenas se ligam em minha mente, um mês de tempo entre elas. Ambas se passam na Rua Visconde de Pelotas, talvez daí a inevitável conexão. A primeira: dia 24 de dezembro, sol se pondo, eu desço a pé a rua, em direção à casa da amiga onde vou partilhar a ceia natalina. O silêncio é quase total sobre a cidade. Raros carros passam, todo mundo já encaminhado aos lares e aos ritos familiares de paz. Ouço um barulho cíclico atrás de mim, amplificado pela quietude da situação. Viro a cabeça. O Velho das Casquinhas puxando seus dois carrinhos. A barba comprida, o gorro vermelho surrado de Papai Noel, que ele usa o ano todo. Seguimos assim, eu na frente, ele logo atrás.
Tique-tique de rodinhas na calçada, nossos passos, rua vazia. Boca da noite de Natal, eu e aquele inusitado Papai Noel somos os únicos transeuntes da ladeira, após cruzar a Tronca. O que fazer? Cedo à emoção algo piegas da data e falo com ele qualquer bobagem, tipo Feliz Natal, mesmo sabendo o quanto ele é arisco? Ou viajo nesse momento no que ele tem de louco? O silêncio maior se impõe. Vez em quando o espio, ele me ignora. O tique-tique dos carrinhos do Velho magicamente reforça a quietude envolvente – bolha no espaço, asas de anjo cobrindo Caxias do Sul. Chego ao meu destino, ele passa, cabeça baixa. Acho nossa caminhada muda uma coisa estranha e bonita. Emoção intraduzível em palavras.
A outra cena, fins de janeiro, é mais rápida, até mais delicada na forma. No meio da tarde quente, uma grande bolha de sabão segue o fluxo dos carros. Uma bolha só, flutuando perto do chão, subindo, descendo. Vem da esquina da Rua Dezoito, no embalo do vento úmido do verão, e cruza pelo meio a Visconde. Vai estourar, vai estourar: encho-me de apreensão, atento aos segundos da milagrosa duração da bolha solitária. Impossível coisa mais banal, mas para mim é coisa luminosa. Tempo brevíssimo, mas intenso. Por fim, o toque do real, negro asfalto: ploft! Penso em falar disso. Falar de bolhas mágicas de luz e silêncio. De fugazes instantes em que os olhos veem, os ouvidos escutam e o coração sente.
Instantes raros. Quero mais.
Duas cenas se ligam em minha mente, um mês de tempo entre elas. Ambas se passam na Rua Visconde de Pelotas, talvez daí a inevitável conexão. A primeira: dia 24 de dezembro, sol se pondo, eu desço a pé a rua, em direção à casa da amiga onde vou partilhar a ceia natalina. O silêncio é quase total sobre a cidade. Raros carros passam, todo mundo já encaminhado aos lares e aos ritos familiares de paz. Ouço um barulho cíclico atrás de mim, amplificado pela quietude da situação. Viro a cabeça. O Velho das Casquinhas puxando seus dois carrinhos. A barba comprida, o gorro vermelho surrado de Papai Noel, que ele usa o ano todo. Seguimos assim, eu na frente, ele logo atrás.
Tique-tique de rodinhas na calçada, nossos passos, rua vazia. Boca da noite de Natal, eu e aquele inusitado Papai Noel somos os únicos transeuntes da ladeira, após cruzar a Tronca. O que fazer? Cedo à emoção algo piegas da data e falo com ele qualquer bobagem, tipo Feliz Natal, mesmo sabendo o quanto ele é arisco? Ou viajo nesse momento no que ele tem de louco? O silêncio maior se impõe. Vez em quando o espio, ele me ignora. O tique-tique dos carrinhos do Velho magicamente reforça a quietude envolvente – bolha no espaço, asas de anjo cobrindo Caxias do Sul. Chego ao meu destino, ele passa, cabeça baixa. Acho nossa caminhada muda uma coisa estranha e bonita. Emoção intraduzível em palavras.
A outra cena, fins de janeiro, é mais rápida, até mais delicada na forma. No meio da tarde quente, uma grande bolha de sabão segue o fluxo dos carros. Uma bolha só, flutuando perto do chão, subindo, descendo. Vem da esquina da Rua Dezoito, no embalo do vento úmido do verão, e cruza pelo meio a Visconde. Vai estourar, vai estourar: encho-me de apreensão, atento aos segundos da milagrosa duração da bolha solitária. Impossível coisa mais banal, mas para mim é coisa luminosa. Tempo brevíssimo, mas intenso. Por fim, o toque do real, negro asfalto: ploft! Penso em falar disso. Falar de bolhas mágicas de luz e silêncio. De fugazes instantes em que os olhos veem, os ouvidos escutam e o coração sente.
Instantes raros. Quero mais.
(Nivaldo Pereira)
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Vem, Fevereiro! Vem, que eu vou te viver... Prometo! Janeiro, lamento por você ir, mas olha... Tu ficaste em mim, de algum modo, como todos os outros anos, meses e dias que já vivi. Adeus!
Postado por Erica Ferro
Postado por Erica Ferro